Só sei que nada sei

No artigo a seguir exploraremos em profundidade Só sei que nada sei, tema que tem gerado grande interesse e debate nos últimos tempos. Desde as suas origens históricas até à sua relevância na sociedade atual, analisaremos o seu impacto em diferentes áreas e a sua influência no quotidiano das pessoas. Através de diversos pontos de vista e opiniões de especialistas, buscamos lançar luz sobre Só sei que nada sei e proporcionar ao leitor uma visão completa e equilibrada deste tema tão relevante na atualidade.


A popular frase só sei que nada sei ou sei uma coisa: que eu nada sei, por vezes compreendida como um paradoxo socrático, é um dizer muito conhecido, derivado da narrativa de Platão sobre o filósofo Sócrates. No entanto, a frase não é mencionada em nenhum texto grego antigo que nos tenha sido legado.

Acredita-se que tenha surgido originalmente em textos escritos em latim, como em "ipse se nihil scire id unum sciat" de Cícero, ou em Nicolau de Cusa com "scio me nihil scire" e "scio me nescire". É possível que seja, então, uma paráfrase de um texto grego antigo, encontrada apenas em latim e vertida na contemporaneidade para o grego catarévussa como " οὐδὲν οἶδα", (lê-se: oudèn oîda). Logo, esse problema teria surgido já na época da tradução latina, muito provavelmente por utilizarem apenas o verbo scire (saber, entender) para traduzir palavras distintas do grego, como (syn)eidénai, epístamai, gignṓskein, sophía e sophós.

O dizer está relacionado com o relato de Querefonte sobre a resposta da sacerdotisa (pítia), no Oráculo de Delfos, em relação à questão "quem é o homem mais sábio da Grécia?". Essa consulta foi narrada por Platão em sua Apologia (21a) e por outro discípulo de Sócrates, Xenofonte, em um outro texto também chamado Apologia (14). No entanto, nesse último relato é dito apenas que ninguém seria mais justo, livre e sensato que Sócrates, não aparecendo a palavra 'sábio'.

No contexto da Apologia de Platão, em 20d, essa questão se relaciona, portanto, à condição humana, detentora de uma sabedoria limitada e ignorante de muitas coisas. Logo a anthrōpínē sophía (sabedoria humana) seria a consciência da sua própria limitação quanto ao saber.

Em Platão

Essa frase é frequentemente atribuída ao Sócrates de Platão, nos tempos antigos e modernos, não ocorre tal como ela é em nenhuma das obras de Platão. Dois proeminentes académicos estudiosos de Platão argumentaram recentemente que a frase não deve ser atribuída ao Sócrates de Platão.

No entanto, Platão relata, em sua Apologia de Sócrates, que:

οὗτος μὲν οἴεταί τι εἰδέναι οὐκ εἰδώς, ἐγὼ δέ, ὥσπερ οὖν οὐκ οἶδα, οὐδὲ οἴομαι

A imprecisão da paráfrase como 'só sei que nada sei' deriva do fato de o autor não estar a dizer que ele nada sabe, mas sim que não pode saber nada com absoluta certeza, mas pode se sentir confiante acerca de certas coisas. Além disso, autores como Gail Fine, Thomas Brickhouse e Nicholas Smith e Gregory Vlastos ressaltam, cada um dentro de sua perspectiva e com suas diferenças, que o “só sei que nada sei” não seria realmente um paradoxo, pois haveria uma distinção entre o que Sócrates se referiria por conhecimento ou sabedoria, havendo uma diferença de nível epistêmico, entre um conhecimento mais alto e completo e outro mais baixo e relacionado à vida cotidiana.

Uma curiosidade é que Sócrates já afirmou em mais de uma passagem das narrativas conhecer algum assunto além da própria ignorância:

Como poderia eu votar ‘Não,’ quando a única coisa que eu digo que entendo é a arte do amor (τὰ ἐρωτικά)?
“Eu não conheço virtualmente nada, exceto um pequeno assunto — amor (τῶν ἐρωτικῶν), embora sobre esse assunto, eu sou pensado como incrível (δεινός), mais do que ninguém, passado ou presente"

Além dos exemplos acima, David Wolfsdorf agrupou mais de trinta alegações de conhecimento (knowledge claims), onde Sócrates diz saber alguma coisa, com valor epistêmico variando desde coisas simples até questionamentos éticos e filosóficos.

Notas

  1. Fine argumenta que "é melhor não atribuí-la a ele". Taylor argumentou que a "formulação paradoxal é uma leitura incorreta de Platão".

Ver também

Referências

  1. FINE, 2008, p. 51.
  2. Cícero, «1», Academica [Acadêmica], I, Tufts, Ele próprio pensa que sabe de uma coisa, que nada sabe .
  3. Uma variante encontra-se em de Cusa, Nicolau (1967), «XIII 146», De visione Dei [Da visão de Deus], Werke (em latim), Walter de Gruyter, p. 312, …et hoc scio solum, quia scio me nescire… . 
  4. «Topic: All I know is that I know nothing», Translatum: The Greek Translation Vortal [Traduzido: o vortal de tradução grega] (em grego) .
  5. Baseado em FINE (2008) e desenvolvido no capítulo 2.11 O PARADOXO EPISTEMOLÓGICO DO “SÓ SEI QUE NADA SEI”, p. 113-117, em CARVALHAR, C. A caça à sabedoria: a sophía a partir d’Apologia de Platão. Mestrado—Rio de Janeiro: UFRJ, 2020.
  6. Apologia (14) de Xenofonte: "Certo dia, Querefonte dirigiu-se ao oráculo de Delfos para o interrogar a meu respeito, na presença de grande número de testemunhas, e Apolo respondeu-lhe que nenhum homem era mais livre, nem mais justo, nem mais sensato do que eu". Ver p. 159 em Pinheiros, Ana. Xenofonte. Apologia de Sócrates: Introdução, tradução do grego e notas. Máthesis, v. 12, p. 133–164, 2003.
  7. CARVALHAR, 2020, p. 109.
  8. Fine, Gail (2008), «Does Socrates Claim to Know that He Knows Nothing?» [Sócrates diz não saber nada?], Oxford Studies in Ancient Philosophy (em inglês), 35: 49–88 .
  9. Fine 2008, p. 51.
  10. Taylor, CCW (1998), Sócrates [Sócrates] (em inglês), Oxford University Press, p. 46 
  11. Platão, Apologia de Sócrates, 21d .
  12. Stokes, Michael C (1997). Apology of Socrates [Apologia de Sócrates] (em inglês). Warminster: Aris & Phillips. p. 18. ISBN 0-85668-371-X 
  13. FINE, 2008.
  14. Ver p. 31, 38 e 72 em BRICKHOUSE, T.; SMITH, D. Plato’s Socrates. Oxford: Oxford University Press, 1994.
  15. VLASTOS, G. Socrate’s Disavowal of knowledge. In: The Philosophical Quarterly. v. 35, n. 138, jan, 1985.
  16. a b CARVALHAR, 2020, p. 114.
  17. Cimakasky, Joseph J.. All of a Sudden: The Role of Ἐξαίφνης in Plato's Dialogues. Doctor of Philosophy Dissertation. Duquesne University. 2014.
  18. Platão. O Banquete}}.
  19. Platão. Theages, 128b.
  20. WOLFSDORF, D. Socrates’ Avowals of Knowledge. Phronesis, v. 49, n. 2, p. 75-142, 2004.