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O dialeto gaúcho, também conhecido como dialeto guasca, é um dialeto do português falado no Rio Grande do Sul e em partes de Santa Catarina. Fortemente influenciado pelo espanhol, por força da colonização espanhola, e com influência mais reservada do guarani e de outras línguas indígenas, possui diferenças léxicas e semânticas muito numerosas em relação ao português padrão - o que causa, às vezes, dificuldade de compreensão do diálogo informal entre dois gaúchos por parte de pessoas de outras regiões brasileiras, muito embora eles se façam entender perfeitamente quando falam com brasileiros de outras regiões. Na fronteira com o Uruguai e Argentina a influência castelhana se acentua, enquanto que regiões colonizadas por alemães e italianos mantém as respectivas influências. Algumas palavras de origem africana e até mesmo da língua inca também podem ser encontradas. Foi publicado um dicionário "gaúcho-brasileiro" pelo filólogo, Batista Bossle, listando as expressões regionais e seus equivalentes na norma culta.
Fonologia
A fonologia do dialeto é amplamente similar ao espanhol rioplatense, compartilhando várias características fonéticas e gramaticais. No aspecto fonético, é notável o ritmo silábico da fala, a vocalização do /l/ para /u/ no final das sílabas e a relativa ausência de importância das vogais nasais, que são praticamente restritas ao som /ã/ e aos ditongos /ão/ e /õe/. No aspecto gramatical, uma das características marcantes é o uso do pronome 'tu' em vez de 'você' (diferente do usado em São Paulo), porém com o verbo conjugado na terceira pessoa, como em 'tu ama', 'tu vende', 'tu parte'. No entanto, também é comum ouvir a conjugação do pronome 'tu' de acordo com a norma culta. No interior do Rio Grande do Sul, outra característica distintiva é a ausência de redução da última vogal nas palavras terminadas em /e/, como em 'leite' (/ˈlejte/) em vez de /ˈlejt(ʃ)i/ e 'tudo' (/ˈtu.do/) em vez de /ˈtu.du/. Em algumas outras cidades da região, o som nasal /ã/ é elevado para /ə̃/.
Algumas das características fonéticas desse dialeto incluem:
Vogais:
Monotongação das vogais pretônicas: Nas sílabas átonas pretônicas, ocorre a monotongação das vogais, como "leite" pronunciado como "laiti" ou "porta" pronunciado como "porta".
Vogal "E" final invariável: A vogal "e" final em sílabas átonas não sofre redução ou neutralização, sendo pronunciada plenamente, como em "peixe" (pronunciado "peche").
Vogal "O" final invariável: De forma similar, a vogal "o" final em sílabas átonas também é pronunciada plenamente, como em "povo" (pronunciado "povo").
Consoantes:
Sibilantes retroflexas: No dialeto gaúcho, ocorre a retroflexão das consoantes sibilantes, como "s" e "z", que são pronunciadas com a ponta da língua voltada para cima, resultando em sons semelhantes aos encontrados em línguas como o castelhano. Exemplos incluem "sabão" (pronunciado "sabã") e "rosa" (pronunciado "rrosa").
Aférese do "r": O som "r" no início das palavras é frequentemente omitido, como em "rio" (pronunciado "io") ou "rasgar" (pronunciado "asgar").
Vocalização do "lh": O som "lh" é frequentemente vocalizado para "i", como em "filho" (pronunciado "fio").
Palatalização do "t" final: Em algumas regiões, o "t" final é palatalizado, tornando-se um som semelhante a "tch", como em "bom dia" (pronunciado "bom dia").
Vocábulos locais
ancinho = rastilho, rastelo, ciscador, catador de folhas
apanhar = levar uma surra (usa-se em outras partes do Brasil)
aspa = chifre
aspaço / aspada = chifrada
atucanado ou tuquiado = atrapalhado, cheio de problemas ou irritado
avio = isqueiro
azulzinho = guarda de trânsito
baita = grande, crescido; (usa-se em outras partes do Brasil)
bagual = excelente, bom, ótimo ou cavalo xucro
bergamota = tangerina
bochincho = festa informal
bodoque / funda = estilingue
bolicho = boteco, botequim
borracho = bêbado
branquinho = beijinho (doce), porém sem coco
brigadiano = policial da Brigada Militar (corporação equivalente à Polícia Militar)
cacetinho = pão francês
campear = procurar, ir em busca de algo
cancheiro = pessoa que tem experiência e/ou habilidade em alguma coisa
capaz = de jeito nenhum, não, de forma alguma.
carpim = meia
casamata = banco de reservas (futebol)
chapa = radiografia ou dentadura
chavear = trancar com a chave
chimia = geleia de frutas
china = à-toa, mulher
chinoca = guria que se pilcha de bota e bombacha ao invés do vestido de prenda, prenda que passou dos 30 anos.
chinaredo = bordel; onde fica o chinaredo
chinchado = cheio, satisfeito, farto
chinelagem = expressão para comportamento despojado, decadente, brega ou desajeitado, ou ainda ato ou objeto de gosto duvidoso ou popular (no sentido de brega). No Nordeste a expressão "fuleragem" tem o mesmo significado.
cupincha = camarada, companheiro, amigo (em outras regiões essa expressão também é usada no mundo do crime, sendo sinônimo nesse caso a comparsa, capacho ou jagunço)
cusco = cachorro, cão pequeno
entrevero = mistura, desordem, confusão de pessoas, briga
faceiro = alegre, contente
fatiota = terno
folhinha = calendário
gaudério = homem do campo (gaudério não é sinônimo de gaúcho, como erroneamente dizem)
xiru = índio ou caboclo. Na língua tupi quer dizer "meu companheiro"
xis = hambúrguer
Expressões locais
aguentar o tirão = suportar as consequências ou uma situação difícil
andar pelas caronas = andar mal, estar em dificuldade
arrastar a asa = enamorar-se
bem capaz = ênfase na negação.
botar os cachorros = xingar, ofender alguém
dar com os burros n'água = dar-se mal, ser mal sucedido
deitar nas cordas = fazer corpo mole
de rédeas no chão = entregue, submisso, apaixonado
de valde = de balde, em vão
de vereda = imediatamente, já
é tiro dado e bugio deitado = acertar de primeira; ter certeza do que faz
entregar as fichas = ceder, concordar
estar com o diabo no corpo = estar furioso, insuportável
faceiro que nem gurí de calça nova = muito contente, alegre
faceiro que nem gordo de camisa nova = o mesmo do item anterior
faceiro que nem égua de dois potrios = o mesmo do item anterior
frio de renguear cusco = Temperatura muito baixa
índio velho = camarada
ir aos pés = fazer as necessidades na patente
juntar os trapos = casar, viver junto
lamber a cria = mimar o filho
lagartear = ficar sem fazer nada, ao sol
matar cachorro a grito = estar sem dinheiro, estar na miséria, viver com dificuldade
me caiu os butiá dos bolso = ficar de queixo caído, espantado
meter a viola no saco = calar-se, desistir, acovardar-se
morar para fora = morar no campo (fazenda, sítio ou vila pequena)
na ponta dos cascos = pisando em ovos/ preparado, pronto - na ponta dos cascos - refere-se a cavalo que está pronto para corrida (favorito)
no mato sem cachorro = em dificuldade, em apuros
olhar de cobra choca = olhar dissimulado
se aprochegar = chegar mais próximo, se acomodar
sentar o braço = surrar, espancar, esbofetetar, bater
terneiro guacho = tomador de leite
tunda de laço = apanhar
Interjeições típicas
Bah! = Puxa!, Nossa!, Que coisa! - é primariamente, uma interjeição de espanto, mas pode ter outros usos, como, por exemplo, mostrar hesitação ao iniciar uma frase.
Tchê! = Expressão utilizada para enfatizar a oração. Assim como Bah pode ser utilizado para muitas coisas, como por exemplo, Tchê, ganhei na loteria!.
Mas que barbaridade! = Que coisa! - é uma interjeição que indica indignação.
Capaz? = É mesmo?, Imagina! - indica espanto e dúvida ao mesmo tempo quanto ao que a pessoa acabou de ouvir.
Bem Capaz! = Com uma entonação típica, significa "De jeito nenhum".
Que tri! = Que legal!
A la pucha! = Interjeição de surpresa que enaltece o que se escutou, como por exemplo, Mas a la pucha que pala bela!
No Rio Grande do Sul: Mas que "guri" ligeiro esse!
Há diferenças também nas próprias regiões do Rio Grande do Sul, por influência da colonização:
Na cidade de Porto Alegre: Bah! Tu viu que o cara cuspiu no chão?
Na cidade de Pelotas: Bah! Tu viste que o cara pulou a cerca?
Outras variações
No Rio Grande do Sul, além deste dialeto, fala-se também o hunsriqueano rio-grandense, uma língua falada entre os colonos alemães e também o talian, dialeto falado pelos colonos vênetos. São considerados línguas/dialetos nativos, uma vez que, embora provenientes de idiomas exóctones (frâncico moselano, muito confundido com o alemão, e o vêneto, também confundido com o italiano), se desenvolveram no Rio Grande do Sul e região.